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A vinda de Jesus Cristo foi providencialmente preparada ao longo dos séculos, até a plenitude dos tempos (Gl 4.4). Podem verificar-se claramente os sinais da mão de Deus a conduzir a história, dentro e fora das fronteiras da Palestina. O mundo inteiro parecia estar se preparando para a vinda do Filho de Deus e para o cumprimento do plano de redenção desde o princípio desenhado a nosso favor.

 

Elementos judaicos de preparação

Esse fenômeno da história verifica-se sobretudo no ambiente da cultura e da religião judaica. Os judeus eram o povo escolhido e divinamente preparado para a vinda do Messias. As Escrituras proféticas são testemunhas disso, e a esperança messiânica é nelas crescentemente instruída e assumida. A própria Diáspora concorreu para o alastramento transcultural dessa viva esperança, pois as sinagogas se espalhavam pelo mundo greco-romano, formando uma rede de difusão dos valores da fé judaica e suas esperanças.

 

Um povo escolhido e divinamente preparado

O povo de Israel foi separado para cumprir a gloriosa missão de trazer a este mundo o Messias Salvador. Foi um povo escolhido em Abraão, que deixou o conforto da sua terra e, em total obediência, seguiu o caminho traçado por Deus “sem saber para onde ia” (Hb 11.8). Foi um povo divinamente preparado a partir de Moisés, um povo que durante muitos séculos teve apenas Deus como seu rei e Senhor, pronto a ir para onde Deus o enviasse, a fazer o que Deus lhe ordenasse, a ser o que Deus desejasse que ele fosse. Foi também um povo que ciclicamente se desviou do seu Senhor e, no final, pôs em causa o reconhecimento e a aceitação do seu Messias.

 

Uma Escritura profética

A Escritura Sagrada foi dada por Deus para conduzir seu povo e predizer a vinda do Messias. Ela foi recebida, acolhida e confessada pelo povo como Palavra de Deus, uma mensagem entregue por “homens santos que falaram da parte de Deus movidos pelo Espírito Santo” (2Pe 1.21); posteriormente, essa Escritura foi traduzida para o grego por 72 especialistas judeus transferidos de Jerusalém para Alexandria.

 

Uma esperança messiânica

Com a restauração do povo de Israel, depois de a voz profética haver silenciado, a ênfase na esperança messiânica era pequena e dispersa. Antes, toda a atenção do povo estava voltada para a observância e a preservação da Lei (Ne 8.1-3; 9.13-34; 13.1-3). Mas, no tempo dos macabeus, as intensas e penosas perseguições despertaram a esperança de um libertador. O ressurgimento dessas esperanças deu-se especialmente com a perseguição movida por Antíoco Epifânio, antes mesmo da tomada de Jerusalém pelos romanos em 63 a.C. O tempo da ocupação romana foi caracterizado por uma real explosão de expectativas messiânicas que culminavam na ideia de uma intervenção de Deus na história. Essas expectativas eram particularmente evidenciadas na literatura apocalíptica da época e nas movimentações sociais resultantes da quebra tão abrupta das aspirações de uma independência real. Na geração que precedeu imediatamente o nascimento de Cristo, os judeus aguardavam a todo momento o advento do Messias. Essa esperança generalizou-se a tal ponto que transcendeu as fronteiras do judaísmo e chegou mesmo a influenciar alguns pensadores gentios. As obras de Tácito e Suetônio dão notícia dessa expectativa generalizada.

 

A Diáspora dos judeus

Os judeus se infiltraram no mundo que veio a ser estabelecido, reconhecido e configurado pelas fronteiras do Império Romano, em consequência de uma série de circunstâncias que os obrigaram progressivamente a isso. Entre essas circunstâncias contam-se:

 

  • As deportações para a Assíria e a Babilônia: A deportação do Reino do Norte para a Assíria em 722 a.C., a do Reino do Sul para a Babilônia em 586 a.C. e a fuga para o Egito, nessa mesma época, de um grupo de judeus levando consigo Jeremias (Jr 42 e 43), todos esses são fatos que contribuíram para o processo dinâmico da Diáspora.
  • Outras movimentações de judeus para o Egito em datas posteriores: Alexandre Magno, por exemplo, promoveu o deslocamento de grande número de judeus, cuja maioria esmagadora se instalou na nova cidade de Alexandria. Também Ptolemeu Sóter e Ptolemeu Filadelfo seguiram seu exemplo. Quando a opressão selêucida se abateu sobre a Palestina, em particular no reinado de Antíoco Epifânio, muitos judeus fugiram igualmente para o Egito. Foi tal sua confluência para o sul que Fílon de Alexandria, contemporâneo de Cristo, calculava haver cerca de um milhão de judeus no Egito. E dali eles se espalharam por toda a costa do norte da África.
  • A Diáspora no tempo da dominação selêucida sobre a Palestina: Estes governantes também tinham por costume estabelecer colônias judaicas nas cidades que fundavam. Seleuco Nicátor convidou-os a se instalarem na sua nova capital, a cidade de Antioquia da Síria. Antíoco, o Grande, desalojou duas mil famílias e deslocou-as da Palestina para a Babilônia, Lídia e Frígia. Dessas últimas regiões, muitos se espalharam posteriormente como comerciantes por toda a Grécia e a Ásia Menor. Assim se justifica que Paulo vá encontrar amplas comunidades judaicas em Bereia, Tessalonica, Atenas, Corinto etc.
  • Afluxo de judeus para Roma: Foi Pompeu quem primeiro levou judeus para Roma como cativos, após a tomada de Jerusalém em 63 a.C. Rapidamente, eles se multiplicaram no tempo de Júlio César e Otaviano, a ponto de constituírem uma vasta comunidade. Repare-se que Paulo encontrou lá um número considerável de judeus quando chegou à cidade como prisioneiro, por ter apelado para César (At 28.17).
  • As próprias sinagogas: No Exílio babilônico e a partir dele, as sinagogas foram centros de culto, mas também de instrução e convívio. Nas sinagogas eram expostas e ensinadas as Escrituras, bem como era propagado o culto dos valores e das esperanças que viria a ter reflexos visíveis na sociedade. Nelas o Senhor Jesus encontrava os lugares preparados e disponíveis para anunciar a boa-nova. Ali também o apóstolo Paulo proclamava o evangelho sem ter de locar o espaço. De igual modo, nelas ambos encontravam suas primeiras congregações, comunidades inicialmente receptivas à palavra da salvação.
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Trecho extraído e adaptado da obra:  Novo Testamento, O: uma introdução histórica, retórico-literária e teológica do autor Manuel Alexandre Júnior publicado por Edições Vida Nova: São Paulo, 2021, p. 99-102. Publicado no site Cruciforme com permissão.

Manuel Alexandre Júnior é doutor em Letras (Literatura Grega) pela Universidade de Lisboa e Mestre em Divindades pelo Seminário de Denver, Colorado, EUA, diretor emérito e professor de Novo Testamento no Seminário Teológico Baptista em Queluz e professor catedrático jubilado e pesquisador da Universidade de Lisboa. Foi professor associado extraordinário de Teologia Reformada na Faculdade de Teologia da North-West University, África do Sul, e de extensão de pós-graduação no Instituto Bíblico Português por vários anos. Ensinou teoria da literatura, línguas e literaturas clássicas; língua, hermenêutica, exegese e teologia bíblicas do Novo Testamento. Recebeu prêmios de mérito e excelência em cultura bíblica, educação teológica, tradução técnica e científica da Retórica de Aristóteles, e de livro na categoria de aconselhamento bíblico. Integrou a equipe de tradução/revisão de “A Bíblia para todos”.

Sua pesquisa centra-se hoje nos estudos bíblicos do Novo Testamento e na obra de Fílon de Alexandria como intérprete das Escrituras. É pastor emérito da Igreja Evangélica Baptista da Amadora e autor de Aconselhamento bíblico: para uma vida de plenitude e harmonia e Exegese do Novo Testamento, publicados por Vida Nova.
Dr. Manuel Alexandre Júnior, renomado autor português, escreveu uma obra que ultrapassa todas as expectativas de uma introdução que se preocupa tão somente com questões de ordem histórica, como autoria, data, fontes, propósito, destinatário e outros tópicos sempre presentes. Além de tudo isso, o leitor encontrará nesta obra:

Ampliação dos horizontes do leitor do texto sagrado para o conteúdo e o sentido de cada livro do Novo Testamento;
Introdução às informações históricas, geográficas e culturais necessárias a uma compreensão contextualizada do texto;
Esboço de princípios hermenêuticos de interpretação que viabilizam uma melhor compreensão das verdades expressas, tanto no plano doutrinário quanto no pedagógico e ético;
Abordagem de questões críticas de pano de fundo, sobretudo daquelas que são úteis tanto para a clarificação do texto quanto para a solidificação da fé;
Reflexão aguda das questões teológicas de fundo no estabelecimento da mensagem que cada livro encerra.
O Novo Testamento: uma introdução histórica, retórico-literária e teológica é indubitavelmente uma obra singular, um livro fundamental que une fé e teologia com o que há de melhor na erudição cristã.

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