Pornografia cristã e pseudoapologética | Maurício Zágari

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Estátua do bobo da corte situada na parte superior de Henley Street em Stratford em Warwickshire, Inglaterra.

Os profissionais de publicidade, marketing e mídia descobriram há muitas décadas uma estratégia infalível para vender seus produtos ou conseguir audiência para seus programas de TV: a pornografia. Por saber que o ser humano é naturalmente atraído por corpos nus e sexualidade, idealizadores de propagandas de produtos (como cerveja, cigarro e automóveis), ou de peças de mídia (como telenovelas e  programas de auditório) passaram a inserir invariavelmente em suas peças mulheres seminuas, homens de tórax de fora e closes de nádegas, seios e  bíceps bem trabalhados. Alguns cristãos do século 21, por sua vez, descobriram a versão gospel da pornografia secular, isto é, uma estratégia infalível para ganhar ibope e arrebanhar curtidas e seguidores: a pseudoapologética. E isso tem sido uma desgraça para o evangelho de Cristo, embora esteja sendo uma bênção para os caçadores de notoriedade.

Apologética é bíblica e necessária. Devemos praticá-la. Devemos denunciar as heresias e os erros teológicos e tentar levar os hereges e os equivocados ao entendimento, ao arrependimento e à conversão. A questão não é fazer apologética ou não, é como fazê-la. E enorme parte da Igreja tem feito uma falsa apologética, destinada não a salvar o herege ou o equivocado, mas a ganhar curtidas, seguidores, popularidade, tapinhas nas costas, admiradores. Pois os pseudoapologetas de internet descobriram que, assim como a pornografia é para o mundo, os ataques e as tretas virtuais, televisivas e radiofônicas são para a igreja: atraem atenção, arrebatam seguidores, geram popularidade e fãs e, o que muitas vezes é o foco, dinheiro.

Em suma: pornografia no mundo e falsa apologética na igreja dão ibope.

A Bíblia é claríssima sobre o jeito certo de evangelizar e fazer apologética, principalmente na passagem áurea sobre o assunto (colchetes meus): “O servo do Senhor não deve viver brigando [!], mas ser amável [!!] com todos [!!!], apto a ensinar e paciente [!!!!]. Instrua com mansidão [!!!!!] aqueles que se opõem, na esperança de que Deus os leve ao arrependimento [!!!!!!] e, assim, conheçam a verdade. Então voltarão ao perfeito juízo e escaparão da armadilha do diabo, que os prendeu para fazerem o que ele quer” (2Tm 2.24-26).

Está escrito para quem quiser ler. Este é o jeito bíblico de fazer apologética: sem briga. Com amabilidade com todos. Com ensino e não ofensas. Com paciência. Com mansidão. Com desejo de que o equivocado se arrependa e não que seja diminuído e envergonhado. Esse é o jeito bíblico de fazer apologética, e não a maneira deselegante, agressiva e depreciativa que tem sido adotada por muitos, em especial na caótica arena das redes sociais. Mas gentileza e não violência não dão ibope, não é? Desembainhemos santas espadas, como os cruzados, e deixemos a gentileza para espíritas como Chico Xavier e a não violência para hindus e jainistas como Gandhi.

Na prática, a falsa apologética não traz como resultado o arrependimento e a conversão do herege e do equivocado, mas somente ódio e desentendimentos entre irmãos. E isso é detestável para Deus: “Há seis coisas que o Senhor odeia, ou melhor, sete coisas que ele considera detestáveis: olhos arrogantes, língua mentirosa, mãos que matam o inocente,  coração que trama a maldade, pés que se apressam em fazer o mal,  testemunha falsa que diz mentiras, e aquele que semeia desentendimento entre irmãos” (Pv 6.16-19).

Em geral, o pseudoapologeta se volta não para a proclamação do evangelho para fora da igreja, mas para as tretas dentro da igreja. Pois, afinal, bater em pastores, teólogos e irmãos que pensam diferente é o que lhes dá popularidade, gera curtidas, arrebata anunciantes blábláblá. Tentar converter cristãos para o cristianismo é o que mexe com as entranhas dos leitores e os fideliza. Isso ocorre porque imaturos espirituais amam agressividade, tretas e bate-bocas, e o pseudoapologeta se aproveita disso. Sim, todo pseudoapologeta é um aproveitador do pecado alheio e da natureza infame de muitos “defensores da boa teologia” que ainda não passaram pela renovação da mente nem entenderam que a boa teologia gera um caráter pacífico e pacificador. Acham virtude na ira, na raiva, no ódio, no linguajar duro e que cospe quando esbraveja, naquilo que faz o velho homem saltar de alegria.

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Frequentemente, o pseudoapologeta se aproveita de excessos de indivíduos célebres da história da Igreja para justificar seus atos irascíveis. Acham, por exemplo, que porque Lutero era verborrágico e grosseiro em seus ataques ao papa, podem ser também. Não entendem que Lutero, como pecador e sujeito à depravação total, podia errar em seu comportamento – como de fato errou, e muito, ao se posicionar desnecessariamente como um bruto na defesa da verdade. Acertar na teologia não dá carta branca para pecar no temperamento e no trato interpessoal, a não ser para quem cultua Maquiavel acima de Cristo. Afinal, a estrada da verdade divina é salpicada de pedregulhos de falhas humanas. Isso para não falar de quando usam Jesus derrubando as mesas dos cambistas para justificar seu modo tolo e depravado de ser – o que mostra que sua hermenêutica é bastante imatura e, francamente, pueril, por mais teologicamente cultos que sejam. Pois a boa apologética não é feita apenas com bons conhecimentos teológicos, ela também precisa de um coração verdadeiramente transformado.

Devemos fugir da facilidade marketeira da pornografia, assim como devemos fugir da tentação do ibope fácil da pseudoapologética, que está para a boa e verdadeira apologética assim como Anitta está para Bach. A boa apologética preza pela verdade de Deus e quer levar o próximo – a quem devemos amar – ao conhecimento da verdade. A pseudoapologética usa Deus como desculpa para ganhos pessoais (notoriedade, curtidas, inscritos no canal, anunciantes, elogios…) e usa tretas, ofensas, deboches, confrontos e ira para diminuir o próximo – a quem devemos amar – e, com isso, insuflar o ego e sair por cima nos debates. Você precisa escolher. A apologética verdadeira é cristocêntrica, pacificadora e amorosa e visa ganhar os errados. A pseudoapologética é egocêntrica, briguenta e arrogante e visa diminuir os errados. É fácil, a partir desse critério, identificar os verdadeiros apologetas e os pseudoapologetas e, com isso, separar o trigo de quem defende a fé biblicamente do joio de quem pratica pornografia gospel. Qual será a sua opção?

Maurício Zágari é membro da Igreja Cristã Nova Vida em Copacabana (Rio de Janeiro, RJ), é casado com Alessandra e pai de Laura. É teólogo, escritor, editor e jornalista. É autor de vários livros, dentre eles "O fim do sofrimento", "Perdão total no casamento" e "Perdão total na igreja". Escreve regularmente em seu blog Apenas (apenas1.wordpress.com).

3 Comments

  1. jairo vivian disse:

    HOJE, O MUNDO CONSIDERA PELO QUE TU TEM, E DEUS CONSIDERA PELO QUE TU ÉS.

  2. Este texto sintetiza de forma concisa e Clara o que considero um atrativo para o “mommy porn”, o pornô leve, que permanece comprometedor da santidade do mesmo jeito, mas lota a sala de alguns cristãos nos domingos.
    Compromete e enfraquece o arraial, pois remove a presença de Deus no ambiente pelo conteúdo.

  3. Danilo Galvão disse:

    Um texto bastante relevante que escancara a estratégia fracassada de uma apologética que a qualquer custo busca visibilidade. Assim como a pornografia, a pseudoapologética é danosa, destrutível, nefasta e nociva tanto para a vida cristã como para aqueles que venham a ser alcançados por seus conteúdos chamativos.

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