Resgatando a Igreja de uma cultura tecnológica | Michael J. Kruger

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Uma das minhas memórias favoritas de infância é ter assistido ao filme Star Wars no cinema em 1977. Eu (junto com o mundo todo) estava aterrorizado. Nunca havia acontecido nada parecido antes. Fomos todos sugados para um novo mundo de espaçonaves, sabres de luz, criaturas estranhas e galáxias distantes. Mas, de todas as coisas que tinham chamado à atenção dos telespectadores de Star Wars, sem dúvida a surpreendente tecnologia do futuro era de longe a do topo da lista. Como seria se tivéssemos robôs com personalidades, se flutuássemos num carro voador, ou se jogássemos “xadrez” com imagens holográficas, e como seria se membros perdidos do corpo fossem substituídos por membros robóticos.

É claro, nos dias de hoje muitas dessas coisas já foram realizadas. De fato, notei que quando meu filho assistiu Star Wars em DVD há alguns anos, ele não se impressionou por nada tecnológico – algumas dessas coisas provavelmente pareceram bem realistas para ele. Ao invés disso, ele ficou hipnotizado por naves voadoras, lutas com sabre de luz e cenas engraçadas de ação. Vivemos em um mundo em que a tecnologia avança em um passo tão incompreensível que quase não temos tempo para nos maravilharmos com ela. Podemos perceber principalmente na área da “mídia social” como o Facebook, Twitter, MySpace, e a simples mensagem de texto (SMS). Nós estamos (supostamente) mais conectados um com o outro, mais próximos um do outro, se comunicando mais uns com os outros do que nunca.

Mas, quando penso no futuro do meu filho, e também sobre a vida nos dias de hoje, faço uma simples pergunta: Como a tecnologia da “mídia social” afeta a forma como vemos a igreja? Como afeta a forma que concebemos a vida no corpo de Cristo? A mídia social tem sua vantagens, é claro. E a igreja tem usado essa tecnologia para a causa cristã. Além disso, não deixo de ressaltar sobre a ironia de escrever sobre os efeitos da comunicação tecnológica em meu próprio website! Não obstante, algumas coisas me preocupam – e também deviam preocupar você. Veja algumas das características da “cultura do Facebook” que com certeza temos que enfrentar como cristãos:

1. Déficit de atenção / Aprendizagem limitada. Quando pessoas conseguem absorver informações no ritmo de mensagens de texto curtas ou “tweets,” é difícil imaginar que consigam ficar sentados durante um sermão de 35 minutos e fiquem parados de forma educada. Isso que dizer que temos que encurtar nosso sermões ou fazer com que sejam mais interessantes? Ou significa que temos que nos esforçar mais para ensinarmos nossas congregações de uma forma que consigam aprender? Espero que a última opção.

2. Pequena visão de autoridade / Excesso de foco na igualdade. Um dos impactos mais negligenciados que o efeito da mídia social causa é sobre a forma que enxergamos as figuras de autoridade. A internet é um grande equalizador – todos têm uma voz. Agora todos têm um palco para falar o que têm em suas mentes, estabelecer a sua paz. Embaixo de qualquer artigo de blog ou notícias uma pessoa pode escrever sua opinião e comentários. E com certeza boa parte disso é bom. Mas, também pode seguir para uma visão de autoridade “igualitária”; em que a opinião de ninguém deve ser valorizada ou ser considerada melhor do que a do outro. Isso se apresenta como um problema para uma eclesiologia bíblica que entende que a igreja e o pastor têm uma verdadeira autoridade na vida de seu povo.

3. Interações “superficiais” / Relacionamentos artificiais. A professora Sherry Turkle da MIT escreveu recentemente o livro Alone Together: Why We Expect More from Technology and Less from Each Other (2011) (“Sozinhos: Por que Esperamos Mais da Tecnologia e Menos dos Outros”). Ela observa que “Em redes sociais como o Facebook, acreditamos que estamos sendo nós mesmos, mas o nosso perfil acaba mostrando outra pessoa, muitas vezes a fantasia de quem queremos ser” (p.153). Em outras palavras, as pessoas talvez se sintam mais conectadas, mas acabam por ficar mais distantes, pelos menos de quem realmente são. Em contraste, uma verdadeira amizade cristã requer que nos engajemos com outras pessoas como realmente somos, para que possamos encarar verdadeiramente os nossos pecados e crescermos juntos em Cristo.

4. Falta de presença física. Turkle observa novamente que “As pessoas admitem rapidamente que prefeririam deixar um recado na caixa postal ou mandar um e-mail do que conversar face a face com outros. As novas tecnologias nos permite diminuir o contato humano, nos permite limitar a sua natureza e extensão” (p. 15). A tecnologia moderna pode criar uma quase não física, quase-Gnóstica existência. É irônico o fato de que um dos inimigos mais velhos do cristianismo era o Gnosticismo, que acreditava que o mundo físico era inerentemente mau e que a salvação era em grande parte uma libertação do corpo físico. Em contraste, a cristandade bíblica sempre teve uma visão robusta e positiva do mundo físico. Relacionamento face a face é importante. De fato, um dia, no novo céu e na nova Terra, teremos novos corpos ressurretos e veremos a Cristo (e outras pessoas) fisicamente. Para sempre.

5. Falta de compromisso / Responsabilidade. Um dos recursos atrativos do estilo de comunicação do Facebook é que ele exige muito pouco de nós. É um interação com pouco comprometimento e pouca responsabilidade. Controlamos (e controlamos por inteiro) a duração, a intensidade, e o nível de contato. A qualquer momento, podemos simplesmente parar. Mas, a vida cristã e relacionamentos verdadeiramente cristãos não funcionam assim. Temos obrigações uns para com os outros, obrigações pactuais. Dito de outro modo, o cristianismo tem um aspecto social que se coloca diretamente contra a tendência de padrões de relacionamentos individualistas e autodeterminados em nossa era tecnológica moderna.

Então, o que devemos fazer? Devemos abandonar a tecnologia do mundo moderno, nos mudarmos para uma fazenda e adotarmos o estilo de vida Amish? De jeito nenhum. O objetivo deste post não é condenar a comunicação tecnológica da modernidade (que eu inclusive estou usando neste exato momento!). Ao contrário, o objetivo foi mostrar que devemos ficar alertas sobre os desafios que a tecnologia trás para ministrarmos no mundo moderno e pós-moderno de hoje. A tecnologia não cria necessariamente pecados padronizados, mas agrava os pecados que já estão presentes em nossos corações e nos corações de nossas congregações. Em outras palavras, temos que dar a eles uma eclesiologia bíblica completamente esférica.

Traduzido por Deborah Brasileiro e revisado por Jonathan Silveira.

Texto original aqui.

Michael J. Kruger (PhD, University of Edinburgh) é presidente e professor de Novo Testamento do Reformed Theological Seminary, em Charlotte – North Carolina. É ministro ordenado da Presbiterian Church in America (PCA), serve como pastor auxiliar de tempo parcial na Uptown Church, é casado com Melissa Kruger e possui um blog: michaeljkruger.com.
Este livro é uma crítica ampla e abrangente da tese de Bauer-Ehrman, segundo a qual a forma mais antiga do cristianismo era pluralista, havia múltiplos cristianismos, e a heresia precedeu a ortodoxia. Köstenberger e Kruger não somente reagem à “teoria de Bauer”, usando os próprios termos da teoria, mas também empregam evidências neotestamentárias negligenciadas para refutá-la. Os autores analisam três elementos como base para as suas conclusões: a evidência de unidade no Novo Testamento, a formação e o fechamento do cânon, e a metodologia e a integridade no registro e na difusão de textos religiosos por parte da igreja primitiva.

Publicado por Edições Vida Nova.

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