Quem foram os magos? | Tony Watkins
23/dez/2024As Escrituras afirmam claramente que Jesus foi concebido no ventre de sua mãe, Maria, por obra miraculosa do Espírito Santo e sem um pai humano.
“Ora, o nascimento de Jesus Cristo foi assim: quando Maria, sua mãe, estava comprometida a casar-se com José, antes que tivessem coabitado achou-se grávida pelo Espírito Santo” (Mt 1.18). Logo depois, um anjo do Senhor disse a José, que estava noivo de Maria: “José, filho de Davi, não temas receber Maria como esposa, porque o que nela foi gerado é do Espírito Santo” (Mt 1.20). Então, lemos que José “fez como lhe ordenara o anjo do Senhor: recebeu sua mulher, contudo não a conheceu [não teve relações com ela] enquanto ela não deu à luz um filho, a quem pôs o nome de Jesus” (Mt 1.24,25).
O mesmo fato é afirmado no Evangelho de Lucas, no qual lemos sobre a aparição do anjo Gabriel a Maria. Depois que o anjo lhe disse que ela teria um filho, Maria perguntou: “Como será isso, visto que sou virgem?”. O anjo respondeu:
O Espírito Santo virá sobre ti,
e o poder do Altíssimo te cobrirá com a sua sombra;
por isso, o menino que nascerá será chamado santo —
o Filho de Deus (Lc 1.35; cf. 3.23).
A importância doutrinária do nascimento virginal é vista em pelo menos três áreas.
Primeiro, ele mostra que a salvação, em última análise, precisa vir do Senhor. Exatamente como Deus havia prometido que a “semente” da mulher (Gn 3.15) por fim destruiria a serpente, Deus torna isso realidade pelo seu próprio poder, não por meros esforços humanos. O nascimento virginal de Cristo é um lembrete inequívoco de que a salvação jamais pode vir por meio do esforço humano, mas precisa ser obra do próprio Deus. Nossa salvação deve-se apenas à obra sobrenatural de Deus, e isso ficou evidente logo no início da vida de Jesus, quando “Deus enviou seu Filho, nascido de mulher, nascido sob a Lei, para resgatar os que estavam sob a Lei, a fim de que recebêssemos a adoção de filhos” (Gl 4.4,5).
Segundo, o nascimento virginal possibilitou a união da plena divindade e da plena humanidade em uma só pessoa. Esse foi o meio empregado por Deus para enviar seu Filho (Jo 3.16; Gl 4.4) ao mundo como homem. Se pensarmos por um momento em outros meios possíveis pelos quais Cristo poderia ter vindo ao mundo, nenhum deles uniria com tamanha clareza a humanidade e a divindade em uma só pessoa. É provável que Deus pudesse criar Jesus no céu como um ser completamente humano e enviá-lo para que descesse do céu à terra sem a participação de genitor humano algum. Mas nesse caso seria muito difícil conceber como Jesus poderia ser plenamente humano como nós somos, e ele também não faria parte da raça humana que descende fisicamente de Adão. Por outro lado, é provável que fosse possível para Deus fazer Jesus entrar no mundo por meio de dois genitores humanos, pai e mãe, e com sua plena natureza divina sendo miraculosamente unida à sua natureza humana em algum momento no início de sua vida. Mas neste caso seria difícil compreender como Jesus seria plenamente Deus, uma vez que sua origem seria como a nossa em todos os sentidos. Quando pensamos nessas duas possibilidades, isso nos ajuda a compreender como Deus, em sua sabedoria, ordenou uma combinação de influência humana e divina no nascimento de Cristo, de modo que sua plena humanidade seria evidente a nós com base em seu nascimento humano comum por meio de uma mulher, e sua plena divindade seria evidente com base em sua concepção no ventre de Maria pela obra poderosa do Espírito Santo.[1]
Terceiro, o nascimento virginal também torna possível a verdadeira humanidade de Cristo sem a herança do pecado. Como observamos no capítulo 24, todos os seres humanos herdaram culpa legal e uma natureza moral corrompida do seu primeiro pai, Adão (às vezes designado de “pecado herdado” ou “pecado original”). Mas o fato de Jesus não ter tido um pai humano significa que a linha de descendência de Adão é parcialmente interrompida. Jesus não descendeu de Adão exatamente da mesma maneira que todos os outros seres humanos descenderam de Adão. E isso nos ajuda a compreender por que a culpa legal e a corrupção moral que pertencem a todos os outros seres humanos não fizeram parte de Cristo.
Essa ideia parece estar implícita na declaração do anjo Gabriel a Maria, em que diz a ela:
O Espirito Santo vira sobre ti,
e o poder do Altissimo te cobrira com a sua sombra;
por isso, o menino que nascera sera chamado santo —
o Filho de Deus (Lc 1.35).
Uma vez que o Espírito realizou a concepção de Jesus no ventre de Maria, o menino devia ser chamado “santo”.[2] Essa conclusão não significa que a transmissão do pecado é feita necessariamente só por meio do pai, pois as Escrituras jamais fazem essa afirmação. Para nós, basta dizer que nesse caso a linha contínua de descendência de Adão foi interrompida, e Jesus foi concebido pelo poder do Espírito Santo. Lucas 1.35 liga essa concepção pelo Espírito Santo à santidade ou pureza moral de Cristo, e a reflexão sobre esse fato nos permite compreender que, pela ausência de um pai humano, Jesus não era descendente completo de Adão, e essa interrupção na linha de descendência foi o método empregado por Deus para fazer que Jesus fosse plenamente humano e, mesmo assim, não partilhasse do pecado herdado de Adão.
No entanto, por que Jesus não herdou uma natureza pecaminosa de Maria? A Igreja Católica Romana responde a essa pergunta dizendo que Maria era isenta de pecado, mas as Escrituras não ensinam isso em parte alguma, e de todo modo isso não resolveria o problema (pois como, então, Maria não herdou o pecado de sua mãe?).[3] Solução melhor é dizer que a obra do Espírito Santo em Maria deve ter evitado não só a transmissão do pecado de José (pois Jesus não teve pai humano), mas também, de maneira miraculosa, a transmissão do pecado de Maria: “O Espírito Santo virá sobre ti […] por isso o menino que nascerá será chamado santo” (Lc 1.35).
Entre os que não aceitam a completa veracidade das Escrituras, pelo menos nas gerações anteriores, tem sido comum a negação da doutrina do nascimento virginal de Cristo. Mas, se nossas crenças devem ser pautadas pelas declarações das Escrituras, com certeza não negaremos esse ensino. Não importa se é ou não possível discernir alguns aspectos de importância doutrinária para esse ensino, devemos crer, em primeiro lugar, simplesmente porque as Escrituras o afirmam. Certamente, esse milagre não é tão difícil para o Deus que criou o universo e tudo o que nele há — qualquer um que afirme que o nascimento virginal é “impossível” só está confessando a própria incredulidade no Deus da Bíblia. E, complementando o fato de que as Escrituras ensinam o nascimento virginal, podemos ver que ele é doutrinariamente importante, e para compreendermos de modo correto o ensino bíblico sobre a pessoa de Cristo é essencial começar com a defesa dessa doutrina.
Notas
[1] 1 Isso não significa dizer que teria sido impossível para Deus trazer Cristo ao mundo por qualquer outro meio, mas somente que Deus, em sua sabedoria, decidiu que esse seria o melhor meio de fazê-lo, e em parte isso se evidencia no fato de o nascimento virginal nos ajudar a compreender como Jesus pode ser plenamente Deus e plenamente homem. A Bíblia não nos diz se qualquer outro meio seria “possível” (em algum sentido absoluto da palavra “possível”) para trazer Cristo ao mundo.
[2]A ESV apresenta o sentido que os leitores do primeiro século teriam compreendido da oração: “Portanto, a criança por nascer será chamada santa”. (Descobri esses exemplos de to gennōmenon pesquisando o banco de dados Thesaurus linguae graecae no computador Ibycus na Trinity Evangelical Divinity School.)
[3] A Igreja Católica Romana ensina a doutrina da imaculada conceição. Essa doutrina não se refere à concepção de Jesus no ventre de Maria, mas à concepção de Maria no ventre da mãe dela e ensina que Maria estava isenta do pecado herdado.
Trecho extraído e adaptado da obra “Teologia Sistemática. Revisada e ampliada”, de Wayne Grudem , publicada por Vida Nova: São Paulo, 2022, p. 735-738. Publicado no site Cruciforme com permissão.
Wayne Grudem é professor pesquisador de Teologia e Bíblia pelo Phoenix Seminary, no Arizona. Foi professor titular do departamento de Teologia Bíblica e Sistemática da Trinity Evangelical Divinity School durante vinte anos. É graduado em Harvard, mestre em Teologia pelo Westminster Theological Seminary e doutor pela Universidade de Cambridge. É autor de Teologia sistemática, Entenda a fé cristã, Política segundo a Bíblia, Economia e política na cosmovisão cristã, Comentário bíblico de 1Pedro e A pobreza das nações, publicados por Vida Nova. |
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