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Ao examinar a questão dos milagres, alguns argumentam que as “leis da natureza” demonstram pela experiência que os milagres são cientificamente impossíveis. C. S. Lewis, argumenta que aqueles que acreditam em milagres não estão negando as normas que Deus estabeleceu na natureza. Entretanto, só porque alguém não observou um milagre não significa que seja impossível. Como José bem sabia, um milagre, de acordo com a própria definição do termo, é uma exceção à regra. Lewis escreve:

“O conceito de que o progresso da ciência de alguma forma alterou essa questão está intimamente relacionado com a noção de que as pessoas ‘antigamente’ acreditavam em milagres ‘porque não conheciam as leis da Natureza’. Por isso, ouviremos pessoas afirmarem: ‘Os primeiros cristãos acreditavam que Cristo era filho de uma virgem, mas sabemos que isso é cientificamente impossível’. Tais pessoas parecem ter a ideia de que a crença em milagres surgiu num período em que os homens eram tão ignorantes com relação ao curso da Natureza a ponto de não perceber que um milagre seria contrário a ele. Se refletirmos por um momento, veremos que isso é tolice, e a história do Nascimento Virginal é um exemplo particularmente surpreendente. Quando José descobriu que sua noiva estava grávida, a decisão de repudiá-la foi natural. Por quê? Porque ele sabia tão bem quanto qualquer ginecologista moderno que, pelo curso normal da Natureza, as mulheres só engravidam quanto têm relações sexuais com um homem. Os ginecologistas modernos evidentemente sabem muitas coisas sobre o nascimento e concepção de filhos que José não sabia. Mas elas não interessam ao ponto central: que um nascimento virginal é contrário ao curso da Natureza. José obviamente sabia disso. Em qualquer sentido que hoje fosse verdadeiro afirmar: ‘Isso é cientificamente impossível’, ele teria dito o mesmo. Isso sempre foi impossível e considerado uma impossibilidade, a não ser que os processos normais da Natureza estivessem, nesse caso em particular, sendo dominados ou alterados por algo além dela. Quando José finalmente aceitou a ideia de que a gravidez de sua prometida não era fruto de infidelidade, mas de um milagre, ele aceitou o milagre como algo contrário à ordem conhecida da Natureza. Todos os relatos sobre milagres ensinam-nos a mesma coisa. Em tais histórias, eles provocam medo e admiração (é justamente o que o próprio termo Milagre implica) entre os espectadores e são considerados evidências de um poder sobrenatural. Se não fossem encarados como contrários às leis da Natureza, como poderiam sugerir a presença do sobrenatural? Como poderiam surpreender se não fossem vistos como exceções à regra? E como algo pode ser considerado exceção até que as regras sejam conhecidas? Se houvesse alguém que não conhecesse absolutamente nada sobre as leis da Natureza, não teria a mínima ideia do que seria um milagre nem sentiria qualquer interesse particular se um deles lhe ocorresse. Nada parece extraordinário até que se conheça o que é ordinário. A crença em milagre, longe de depender da ignorância em relação às leis da Natureza, só é possível na medida em que essas leis são conhecidas. Já vimos que, se começarmos a excluir o sobrenatural, reconheceremos milagre algum. Devemos acrescentar ainda que, da mesma forma, não os reconheceremos, a menos que acreditemos que a Natureza opera segundo leis regulares. Se você ainda não observou que o Sol sempre nasce no Leste, também não irá se admirar se um dia ele nascer no Oeste.

Se os milagres nos fossem apresentados como eventos normais, o progresso da ciência, cujo objetivo é mostrar-nos como as coisas normalmente ocorrem, dificultaria a crença neles e, por fim, a tornaria impossível.

[…]

Nesse sentido, supor que o avanço da ciência tenha dificultado a aceitação de milagres é meramente um raciocínio confuso. Sempre soubemos que são contrários ao curso natural dos acontecimentos. Sabemos também que eles são possíveis, se houver algo além da Natureza. Esses são os elementos essenciais da questão. O tempo, o progresso, a civilização e a ciência não os alteram de modo algum. Os fundamentos para a crença ou descrença hoje são os mesmos de mil ou dez mil anos atrás. Se José não tivesse fé para confiar em Deus ou humildade para reconhecer a santidade de sua mulher, talvez não tivesse acreditado na origem milagrosa do Filho de Maria tão facilmente quanto qualquer homem hoje em dia. Por sua vez, qualquer homem de hoje que acredite em Deus pode aceitar o milagre com a mesma facilidade que José. Você e eu podemos não concordar […] quanto à ocorrência ou não de milagres. Contudo, pelo menos não vamos falar tolices nem permitir que retóricas vagas sobre o curso da ciência nos enganem com a suposição de que o mais complicado relato do nascimento, em termos de gene e espermatozoides, nos deixe mais convencidos que antes de que a natureza não envia bebês a senhoritas que ‘não conheceram homem’.”

Fonte: C. S. Lewis, Milagres. Ed. Vida: São Paulo, 2001, pp. 77-80.

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C. S. Lewis (1898-1963) foi um dos gigantes intelectuais do século 20 e, talvez, o mais influente escritor cristão de sua época. Foi professor de literatura inglesa na Universidade de Oxford até 1954, quando foi eleito por unanimidade para ocupar a cadeira de inglês medieval e renascentista na Universidade de Cambridge, cargo que ocupou até se aposentar. Entre as suas obras mais apreciadas estão a série As Crônicas de Nárnia, Cartas de um Diabo a seu Aprendiz, Os Quatro Amores e Cristianismo Puro e Simples.

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