O prazer de Deus em tudo o que ele faz | John Piper

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Foto de David Mullins na Unsplash

Tudo o que agrada ao Senhor

Se Deus não é coagido por forças externas para que aja de modo contrário ao seu bom prazer, agindo, em vez disso, unicamente em razão do transbordamento de alegria de sua autossuficiência sem limites, segue-se que todos os seus atos são expressão de alegria e que ele tem prazer em tudo o que faz. Começamos nossas reflexões bíblicas com o salmo 135. O texto nos conclama inicialmente para que louvemos ao Senhor: “Louvai ao Senhor! Louvai o nome do Senhor, dai louvor, ó servos do Senhor”. Em seguida, no versículo 3, o salmista começa a nos dar razões pelas quais deveríamos sentir o louvor brotando do nosso coração em direção a Deus. Diz ele, por exemplo, que o Senhor é “bom e misericordioso” (v. 3), e que ele “escolheu Jacó para si” (v. 4), e que ele é grande e está acima de todos os deuses (v. 5). Depois, no versículo 6, essa lista de motivos para louvá-lo chega ao clímax com a grandiosa afirmação:

 O Senhor faz tudo o que lhe agrada,
no céu e na terra,
nos mares e em todos os abismos

De modo semelhante, em Salmos 115.1-3, essa nota ressoa com clareza e força. Ela começa conclamando a Deus para que glorifique a si mesmo e culmina com a declaração de sua soberana liberdade nos céus:

Não a nós, ó Senhor, não a nós,
mas ao teu nome dá glória,
por causa de seu amor inabalável
e da tua fidelidade.
Por que diriam as nações:
“Onde está o Deus deles?”
O nosso Deus está no céu
e faz tudo o que lhe agrada.

O que esses dois versículos (Sl 135.6; 115.3) ensinam é que tudo aquilo que Deus tem prazer em fazer, ele o faz, e não pode ser impedido de fazer. Ou, dito de outra forma, Deus tem prazer em tudo o que faz. Não é possível impedi-lo de fazer aquilo que tem mais prazer em fazer. Não é possível forçá-lo a fazer aquilo em que Deus não tenha prazer. Essa é uma verdade em qualquer parte do universo. Esse é o significado de “no céu e na terra, nos mares e em todos os abismos” (Sl 135.6).

O profeta Isaías é outra testemunha dessa verdade. Deus fala por intermédio dele e diz:

Eu sou Deus, e não há outro;
eu sou Deus, e não há nenhum como eu,
que declare desde o princípio o fim
e desde a antiguidade as coisas que ainda não sucederam,
dizendo: “Meu conselho subsistirá,
e realizarei todo o meu prazer
(Is 46.9,10).

A palavra traduzida por “prazer” (hēphetz) é a forma substantivada do verbo “agrada” (haphētz) em Salmos 135.6 e 115.3. É o termo usado em Salmos 1.2 (“Seu prazer está na Lei do Senhor”), Salmos 16.3 (“Eles são os ilustres nos quais está todo o meu prazer”) e Isaías 62.4 (“Você será chamada ‘Meu prazer está nela’ e a sua terra, ‘a Casada’, porque o Senhor se agrada de ti, e a tua terra se casará”).

Liberdade soberana 

O fato é que Deus age com liberdade soberana. Seus atos não brotam da necessidade de compensar deficiências, mas, sim, da paixão de exprimir a abundância do seu prazer. É esse o significado da sua liberdade. Chamei-a de liberdade soberana porque essa é a nota que soa em todos os três textos que examinamos — Deus, de fato, realiza todo o seu prazer. Ele é livre no sentido de que não tem deficiência alguma que o torne dependente, e é soberano no sentido de que pode agir a partir de seus prazeres sem ser detido pelas forças externas a ele. “E faz tudo como lhe agrada.” Portanto, sua liberdade é uma liberdade soberana.

O que Deus Pai vê quando contempla o panorama de suas próprias perfeições na Pessoa do seu Filho é uma cena plenamente satisfatória de sabedoria, amor e poder infinitos. Desse modo, sua felicidade flui das suas perfeições, incluindo da perfeição do seu poder infinito. É esse poder imensurável que garante a liberdade do prazer divino em tudo o que faz. Seu prazer é a alegria que ele tem no reflexo de sua própria glória na pessoa do seu Filho. Contudo, parte dessa glória é o poder infinito. E a única função do seu poder consiste em abrir caminho para o transbordamento da sua alegria na obra da Criação e da Redenção. É seu poder que remove (no tempo de Deus e do jeito de Deus) quaisquer obstáculos à realização de seu bom prazer. Portanto, a declaração de que Deus faz tudo o que lhe agrada é uma declaração do seu poder. É isso o que queremos dizer com soberania — o poder de Deus sempre abre caminho para que suas perfeições sejam expressas de acordo com seu bom prazer.

Gosto muito da imagem que C. S. Lewis usa para se referir à liberdade soberana de Deus na Criação. Ela mostra como o bom prazer do seu coração para criar e salvar é o transbordamento feliz de toda a sua autossuficiência. Diz Lewis:

Ser soberano do universo não é grande coisa para Deus […] Devemos ter sempre diante dos olhos aquela visão de Lady Juliana em que Deus levava na mão um pequeno objeto semelhante a uma avelã, e aquela avelã era “tudo o que fora criado”. Deus, que não precisa de coisa alguma, traz à existência, por amor, criaturas totalmente supérfluas para amá-las e aperfeiçoá-las.[1]

Em uma classe à parte 

Essa conexão entre poder e prazer está por trás de 1Timóteo 6.15,16, em que o apóstolo Paulo se refere a Deus como “o bem-aventurado e único Soberano, o Rei dos reis e Senhor dos senhores, o único que tem a imortalidade”. “Bem-aventurado” (makarios) significa “feliz” (1Tm 1.11). Portanto, Paulo está se referindo ao “feliz e único soberano”. Observe o que ele enfatiza ao chamar Deus de “bem-aventurado” ou “feliz”. O que o apóstolo enfatiza é o poder exclusivo e único de Deus sobre todos os demais poderes. Em primeiro lugar, ele é chamado de “único Soberano” — não apenas de Soberano, mas o único Soberano. Em outras palavras, não há concorrentes importantes para o seu poder. Ele é o único “poderoso”.

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Em seguida, Paulo diz que esse Deus feliz é o “Rei dos reis”. Mais uma vez a ideia é que ele está acima de todas as demais autoridades governamentais que pareçam desafiar seu poder e sua liberdade de agir como lhe apraz. Depois, Paulo diz que ele é “Senhor dos senhores”. Supondo que haja deuses ou senhores (e há!), o apóstolo ressalta que não há nenhum que possa subverter com sucesso o poder e a liberdade do Senhor dos senhores (1Co 8.5,6). Por fim, Paulo diz que Deus é “o único que tem a imortalidade”. Deus está em uma classe à parte. Todos os demais seres dependem do seu poder criador para sua existência e vida (At 17.25). Ele não depende de ninguém.

Tudo isso nos ensina que a felicidade de Deus está enraizada em seu poder e autoridade totalmente únicos no universo. Ele é o “único Soberano”, portanto é o Soberano feliz, porque não há quem possa frustrar o que ele planeja fazer de acordo com seu bom prazer. C. S. Lewis disse isso da seguinte maneira: “A liberdade de Deus consiste no fato de que nenhuma outra causa, exceto ele mesmo, produz seus atos, e nenhum obstáculo externo os restringe — sua própria bondade é a raiz da qual todos eles brotam e sua onipotência é o ar em que todos florescem”.[2]


[1] Citação extraída de C. S. Lewis, The four loves, in: Clyde Kilby, org., A mind awake: an anthology of C. S. Lewis (New York: Harcourt, Brace and World, 1968), p. 85 [publicado em português por Thomas Nelson Brasil sob o título Os quatro amores].

[2] Citação tirada de The problem of pain, in: ibidem, p. 80 [publicado em português por Thomas Nelson Brasil sob o título O problema da dor].

Trecho extraído da obra “Os prazeres de Deus”, publicada por Vida Nova: São Paulo, 2023, p. 55-58. Traduzido por A. G. Mendes. Publicado no site Cruciforme com permissão.

John Piper é fundador e professor do ministério desiringGod.org. É chanceler do Bethlehem College & Seminary, em Mineápolis, Minessota. Serviu por 33 anos como pastor da igreja Bethlehem Baptist Church e é autor de mais de 50 livros, entre eles 'O racismo, a cruz e o cristão', publicado por Vida Nova, e 'Em busca de Deus' e 'Graça futura', de Shedd Publicações.

Não é verdade que só conhecemos de fato uma pessoa quando entendemos o que a faz feliz? Com Deus também é assim!

O que será que dá prazer ao Ser mais feliz do universo? Para John Piper, apenas quando compreendemos o que torna Deus feliz é que conheceremos a grandeza de sua glória. Portanto, é preciso entender quais são “os prazeres de Deus”.

Ao contrário de muita coisa escrita atualmente, este não é um livro sobre nós. É sobre Aquele para o qual fomos criados, o próprio Deus. Nesta obra-prima teológica, escolhida pela revista WORLD como um dos cem livros mais importantes do século 20, John Piper apresenta as provas bíblicas que nos ajudam a compreender o que os prazeres de Deus nos revelam sobre Ele e como podemos desfrutar deles. Assim, refletiremos em profundidade, e de modo gratificante, servindo-nos da única fonte de onde brota a água viva.

Os seguidores de Jesus precisam agora, mais do que tudo, conhecer e amar, contemplar e abraçar o Deus da Bíblia, que é grandioso, soberano e feliz.

Publicado por Vida Nova.

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