Mentirinhas e outros enganos | Gregory Koukl

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Mentir é certo, em algum momento? E transgressão? E violência? Alguns pensamentos para ajudar você a afiar sua habilidade de tomar decisões éticas.

Eu penso que mentir é errado. Porém, nós temos de ser claros quanto ao que constitui o ato de mentir, ou seja, engano imoral.

Parece que nem todo engano é imoral. Você alguma vez já blefou jogando basquete? Tal simulação não é um engano? É, mas não acho que a maioria das pessoas a considerariam imoral, mesmo sendo, de fato, enganosa.

Há outros exemplos. Vestimo-nos de forma a valorizar a nossa própria figura em vez de sermos inteiramente francos em relação à nossa forma física. Usamos apliques se nossa cabeleira não é espessa como gostaríamos de mostrá-la. Às vezes, não apresentamos toda a verdade. Mais poderia ser dito, mas retemos informação.

Então parece razoável dizer que há “enganos” os quais não consideraríamos mesmo imorais – blefar no basquete, vestir-se buscando uma boa aparência, ou não sendo francos com toda a informação que podemos ter.

Aliás, eu não acho que Jesus foi sempre franco. Veja, por exemplo, a mulher próxima ao poço (João 4). Jesus tinha um objetivo sobre o qual não foi franco, a princípio. Porém, eu não vejo isso como manipulação, mas como sensibilidade ao momento. Se Jesus não foi totalmente franco em alguns casos, e sabemos que Ele nunca cometeu pecado, então isso significa que não é necessariamente um pecado se você não é franco sobre tudo.

Tome este exemplo. Você entra em uma loja e quer conseguir o melhor preço por algo que pretende comprar. Você já andou pesquisando, mas não deixa transparecer. Ao invés disso, como tática, você se faz de bobo. Há um certo engano aqui, alguém poderia argumentar, mas acho que você dificilmente chamaria isso de pecado. Parece que não somos obrigados a dizer tudo que sabemos.

Há enganos bem visíveis que são claramente pecaminosos. Então parece que também há uma categoria de enganos que não chegam à categoria de pecado. Então você tem, no meio, situações que eu chamaria de dilemas morais. Esses são julgamentos mais difíceis de realizar.

Um dilema moral é quando você tem de escolher entre duas coisas, mas o que escolher seria errado por si só. Você coloca uma vida humana em perigo, ou conta uma mentira? Se escolher dizer a verdade, e você pode estar certo por dizer a verdade, parece que você age errado expondo um ser humano a sérios malefícios. Se você protege o ser humano através de uma mentira, bem, você salvou uma vida, mas contou uma mentira. Isso é um dilema moral ou ético.

Existem umas duas formas diferentes usadas pelos cristãos para abordar isso. Uma é dizer que não existe dilema moral ou coisa assim. Alguns dirão que você nunca deve mentir, deve sempre dizer a verdade, e deixar que Deus se preocupe com as consequências.

E se você vir uma mulher correr para um beco na tentativa de escapar de alguém que está tentando matá-la, e então a pessoa lhe pergunta “Onde ela está?”? O que você faz? Envia o potencial assassino em uma busca inútil para proteger a vida da mulher? Ou o conduz à sua vítima?

Alguns diriam que você é moralmente obrigado a contar exatamente onde ela está escondida e deixar que Deus tome conta. Mas isso pode ser uma faca de dois gumes. Por que não protegê-la com uma mentira e deixar que Deus cuide disso perdoando a mentira? Qual você escolhe? Essa pergunta está no coração de todos os dilemas éticos.

A Bíblia nos dá certo direcionamento aqui. Ela ensina que os pecados não são todos iguais. Alguns são mais expressivos que outros. Isso é bem claro nas Escrituras. Jesus disse a Pilatos, “Aquele que me entregou a ti maior pecado tem” (João 19:11). De acordo com Jesus, alguns pecados são maiores que outros.

O senso comum, por si, nos diz que roubar um lápis não é um pecado tão sério quanto tirar a vida de alguém. Não caia no erro, ainda é um pecado, e mesmo um pecado pequeno é suficiente para fazer-nos culpados ante Deus. Mas nem todo pecado é igual para Deus. Ele com certeza faz diferenças. E porque Deus faz diferenças, é possível que resolvamos dilemas éticos. Quando presos entre duas opções, escolhemos o bem maior.

O que dizer das chamadas “mentirinhas” ou “mentiras brancas”. Tudo bem, já que são apenas pequenas enganações? Minha regra é: Eu penso que pessoas devem dizer a verdade a menos que elas tenham uma razão moral de mais peso, que justifique não serem francas.

Se minha esposa me perguntasse se eu a achava acima do peso e ela estivesse, eu não diria, “Não, querida, você está perfeita.” Primeiro, ela provavelmente saberia que não. Segundo, acho que ela estaria, na verdade, buscando afirmação de mim, não realmente querendo uma avaliação do seu peso. Eu diria a ela o que pensava, mas seria cuidadoso de fazê-lo de uma forma que a protegesse como indivíduo. Deixaria claro que estar acima do peso não mudaria meu amor por ela.

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Aqui vai outro exemplo, um clássico para rapazes solteiros. Um rapaz sai num encontro e não se agrada, então ele não estaria inclinado a chamar a moça para sair novamente, apesar de suspeitar de que ela se divertiu e gostaria que tivessem um tempo juntos novamente. O que ele diz ao deixá-la em casa? Ele não dirá “Eu nunca vou te chamar para sair de novo”, mas ele também não quer simplesmente sair andando calado. Por causa do constrangimento ele diz, “Vou te ligar,” mas ele não pretende e nunca o faz.

Penso que isso é errado. Não há razão moral para mentir para ela. Ele está apenas livrando-se de um pequeno constrangimento, mas ele está contando uma inverdade.

Também acho que é errado dizer às crianças que Papai Noel é real. Isso não chega a um objetivo moral superior. É apenas engano. As crianças podem, mais tarde, achar que você as enganou sobre Deus, também. Elas não podem ver Papai Noel e nem podem ver Deus. Não existe bom motivo para criar um problema que começa em enganação.

É necessário certo desenvolvimento moral para poder solucionar dilemas éticos. Pessoas que não estão trabalhando nisso não serão capazes de tomar decisões éticas boas porque elas não estão alertas a distinções éticas.

J. P. Moreland uma vez perguntou por que ele deveria confiar no julgamento moral de um especialista intelectual, ou estrela “hollywoodiana”, etc., se eles não dedicaram qualquer esforço em desenvolver suas sensibilidades morais. Você poderia pedir a opinião de alguém como Madre Teresa, que dedicou sua vida a fazer o bem e desenvolver comportamento virtuoso. Pela prática, ela desenvolveu seu senso de julgamento ético. Mas por que ir a qualquer um, que não fez nada para desenvolver suas sensibilidades éticas e que é basicamente comprometido com o egoísmo ético? Por que deveríamos aceitar sua orientação?

Por que deveríamos aceitar a avaliação ética de Hollywood sobre qualquer coisa? Por que deveríamos ligar para o que um ator famoso pensa sobre homossexualidade, ou aborto, ou qualquer outra questão ética? Não estou tentando conceber uma falácia genética aqui e dizer que atores famosos não sabem de nada. O que estou dizendo é que o que vemos na maioria dessas pessoas, uma vez que tenhamos sido expostos às suas vidas privadas, são pessoas de ocupação profundamente egoísta. Suas vidas giram em torno deles mesmos, não de viver moralmente. Por que deveríamos nos importar com sua avaliação ética sobre qualquer coisa? Eles não são qualificados.

Só podemos aprender a resolver problemas éticos se dedicamos certo esforço a pensar no assunto e a viver a vida ética.

Penso que mentir é certo, às vezes. Penso que Raabe fez o certo quando mentiu sobre os espias. Penso que as parteiras egípcias agiram certo quando mentiram a Faraó para proteger as vidas das crianças hebreias.

Penso que transgredir é certo, às vezes. Penso que violência é certo, às vezes. Penso que há muitas coisas que, em isolado, seriam erradas, mas quando um bem maior moral é servido, elas não só deixam de ser erradas, elas tornam-se obrigatórias. Isso é difícil para alguns aceitarem.

Raabe foi obrigada a mentir para proteger as vidas daqueles espias. Tanto Tiago como o escritor de Hebreus aplaudem-na por sua ação. Eles não disseram “Que coisa feia! Mas acho que você escolheu o menor de dois males.” Em vez disso, eles agiram como tendo ela escolhido o melhor de dois bens. Ela fez o que era certo.

Penso que esta é a visão bíblica. Em Atos 4, os apóstolos foram mandados desobedecer o governo e pregar o evangelho. Paulo diz que somos obrigados a obedecer ao governo. Porém, quando o governo diz-nos para desobedecer um comando mais alto de Deus, então somos moralmente obrigados a desobedecer o governo. Devemos escolher o bem maior, como fizeram os discípulos.

Isto é uma transcrição de um comentário feito no programa de rádio “Stand to Reason,” com Gregory Koukl. Disponível para você sem taxa por uma dádiva de fé daqueles que sustentam Stand to Reason. Reprodução permitida apenas para uso não-comercial. ©1995 Gregory Koukl

Traduzido por Mariana Monteiro e revisado por Jonathan Silveira.

Texto original aqui.

Gregory Koukl obteve seu mestrado em filosofia da religião e ética na Talbot School of Theology e seu mestrado em apologética cristã na Simon Greenleaf University. É professor adjunto de apologética cristã na Biola University. Tem apresentado seu próprio programa de rádio por 20 anos, onde defende a cosmovisão cristã.

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