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Meu Caro Vermebile,

Seu novo encarregado é um seminarista, um jovem de vinte e oito anos de idade, com idealismo de sobra, mas pouca experiência ou conhecimento da Bíblia ou de sua própria alma. Anote isso! Você sabe como nosso Pai Abaixo ama a ignorância e o entusiasmo imprudente. A propaganda do outro lado diz que o “temor do Senhor é o princípio do conhecimento.” Portanto, precisamos ficar atentos para não deixar que esses crentes bobinhos entendam isso bem. É melhor dar-lhes mais da “fé cega”, a qual podemos travestir como “espiritualidade mais profunda”. Uma vez que amamos as trevas, a palavra “cega” nos cabe muito bem.

Eu ainda terei muito a lhe dizer sobre como tentar esta criatura miserável, mas vamos começar com um ponto cego no qual obtemos bastante sucesso: tecnologia. Sim, sim, eu sei que temos experimentado algumas perdas para a causa subterrânea por conta da tecnologia: a utópica e irrealista mensagem cristã se espalhou por todo o mundo através da tecnologia. Mas deixe seu jovem pensar apenas no alcance da tecnologia, e não nos seus efeitos mais sutis. Seu jovem está acostumado desde a sua mais tenra idade a tê-la dançando em volta dele e dançando dentro dele. Ele nunca pensa duas vezes (ou mesmo uma vez) nela – exceto em como usá-la. Oh, como ele pode usá-la! Ele tem um iPod assim que pode comprar um. Ele “trocava” arquivos de música mesmo antes disso se tornar ilegal. Devo acrescentar, na minha sublime humildade, que eu mesmo inventei esta forma de se referir ao roubo – “troca”. Oh, como os otários engoliram isso.

Bem, de volta ao assunto. Ele foi criado em frente da televisão, nunca dirige sem música ou com o rádio desligado (e tem rádio via satélite desde que saiu), leva o seu laptop a qualquer lugar e é conhecido por ficar sentado por horas com seus amigos jogando nele (enquanto eles jogam com os deles). Certa vez eu o vi com seu iPod explodindo em seus ouvidos, enquanto ele olhava para o seu laptop e falava em seu telefone celular! Isso me fez ganhar a semana. Ele raramente lê, mas foi capaz de obter um GPA de 3,5* na universidade através de sua esperteza nativa, um monte de besteiras, e várias aulas fáceis cheias de gráficos em PowerPoint, vídeos e assim por diante. E ele agradece a Deus por tudo isso. Como eu adoro esse tipo de fé. É positivamente contagiante nos Estados Unidos: tanto dinheiro, tanta liberdade, tão pouco conhecimento. Estamos indo bem aqui, Vermebile.

Agora aqui está seu plano. Este seminário (como eles chamam) pode dar-lhe pensamentos seminais sobre o inimigo – você sabe, toda aquela podridão sobre sua santidade, poder, amor, sabedoria… ah, eu não consigo continuar. Ele terá aulas inteiras sobre teologia (mas nenhuma, graças a escuridão, sobre demonologia), Bíblia, e apologética (a matéria que mais odeio; pensamento racional em serviço do cristianismo é muito perigoso). Seria realmente prejudicial para a nossa causa Luciferiana se aquele jovem percebesse as possibilidades que estes anos lhe abririam. Ele poderia se tornar uma pessoa de conhecimento e sabedoria – ou, no mínimo, estar no bom caminho. E se assim for, ele pode até entrar para nossa lista dos Dez Maiores Alvos em sua cidade quando assumir uma igreja.

Mas não se assuste, temos uma aliada: a tecnologia. Estes terráqueos embriagados amam os seus aparelhos. Na verdade, eles muitas vezes os adoram. (Realmente, eles os adoram. Eles ficam paralisados por eles, surpreendem-se na presença de um novo, e ficam deprimidos quando um deles não consegue satisfazê-los.) Eles acham que estes dispositivos são ferramentas neutras, e que eles sempre precisam de mais ferramentas. Eles tornaram-se “ferramentas de suas ferramentas”, assim como Thoreau disse, antes mesmo que tivéssemos inventado a televisão. Eles nunca aplicam nada de sua preciosa teologia para saber como usar ou se eles devem usar as tecnologias. Mesmo com toda a sua preciosa tagarelice sobre “discipulado” e “formação espiritual”, eles nunca pensam em como as tecnologias podem afetar suas almas. E, oh, como eu amo essa ignorância! Ela convém a eles, esses crentes pegajosos.

Leia também  As origens tecnológicas do protestantismo ou o mito tecnológico de Martinho Lutero | Michael Sacasas

Então, aqui vão os detalhes. Eu fico arrepiado só de pensar nisso! Informe o seu encarregado de que ele deve fazer o máximo que puder no seminário. Ele deve ser multitarefa. Por que parar em algum momento?! Ele deve levar seu laptop para a sala de aula e nunca ficar longe dele. Diga a ele que ele não precisa apenas anotar o conteúdo nele, mas que pode usá-lo para pesquisar na Internet artigos relacionados, histórias, fotografias e muito mais. Em seguida, tente-o a enviar e-mails, verificar sua página do E-Harmony (falarei mais sobre as possibilidades do romance digital e pós-moderno em outra carta), fazer compras, e jogar videogames. Qualquer peso de consciência acerca de não estar prestando atenção no professor ou de não ser respeitoso pode ser explodido em um momento, dizendo-lhe o seguinte:

“Você é jovem. Você é um nativo digital. Você sabe como usar todos esses dispositivos e os usa bem o tempo todo. O velho professor pode ser interessante, mas ele está amarrado ao passado. Ele é um imigrante digital. Ele não entende. Ele nem mesmo sabe enviar mensagens de texto e não entende o seu telefone celular. De fato, seu telefone mais se parece com uma pedra de estimação – é tão primitivo! Então, ouça apenas os pontos altos da aula (especialmente quando ele começar a gritar), mas continue explorando o gigantesco mundo da Internet. Você pode fazer tudo isso, e estar em todos os lugares o tempo todo.”

Aí está, Vermebile. Você pode se surpreender com o quão eficaz (e bem-humorada, ao menos para nós) é esta estratégia para manter o conhecimento e a sobriedade longe de seu encarregado. E, pelo amor do inferno, não deixe que ele leia Jacques Ellul ou Neil Postman.

De seu tio carinhoso,
Fitafuso.

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*GPA significa grade point average e é um índice de rendimento acadêmico utilizado nas universidades estadunidenses, variando de 0.0 (nota F) a 4.0 (nota A).

Traduzido por Fernando Pasquini Santos e revisado por Jonathan Silveira.

Confira o texto original, clicando aqui.

Douglas Groothuis é professor de filosofia no Denver Seminary. Coordena o curso de apologética cristã e ética e dirige o Gordon Lewis Center for Christian Thought and Culture. Obteve seu PhD em filosofia na University of Oregon em 1993, e está no Denver Seminary desde então.

2 Comments

  1. Bruno Pulis disse:

    Maravilhoso esse texto.

  2. Jesse SALVINO CARDOSO disse:

    Bom texto, parabéns, gostei muito da importância do assunto em foco. Parabéns

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